sexta-feira, 24 de fevereiro de 2017

Estas lutas, ensinaram-me a ser Mãe

Eu sou a Tânia Palmeiro, tenho 33 anos e gosto de dizer que os meus filhos são 2 milagres!
Sempre tive o desejo de ser mãe nova mas, honestamente, nunca tão nova como acabou por acontecer. Tinha apenas 19 anos. Escusado será dizer que todos acharam que estávamos     L-O-U-C-O-S e até certo ponto, quem sabe se não teriam razão?
Pouco antes do nosso primeiro Natal juntos descobrimos que eu estava grávida! Foi um misto de emoções. Se por um lado o meu marido ficou delirante, eu alternava entre a euforia de ser mãe, a incerteza das minhas futuras capacidades assim como a sensação de que iria perder a minha juventude.  
Não foram nada fáceis os dias que antecederam a primeira ecografia, no entanto todas as incertezas e dúvidas desapareceram e quando soubemos que era uma menina, então! Deus tinha ouvido a minha oração e a Madalena estava a caminho.
Fora uns pequenos sustos, posso dizer que no geral a gravidez correu sem problemas e por essa razão não tive um acompanhamento especial.
Eu morria de medo do parto e quando mais a data se aproximava, mais medo eu tinha mas, no geral, até que estava tranquila. 

Na tarde do dia 30 de Agosto de 2003, era sábado e do nada, comecei a ficar pálida, lábios roxos, com náuseas e a bebé a mexer pouco. Recorri à urgência, a bebé foi monitorizada e mediram-me a tensão. Estava com sintomas de possível pré-eclâmpsia porém, mandaram-me para casa. Na madrugada de 2 de Setembro, 2 dias depois, recorri à urgência pois a Madalena estava a dar sinal. Eu nunca poderia imaginar o que me esperava. Entrei no Bloco de Partos às 6h30 da manhã e fui levada para uma cesariana de urgência apenas às 20h. Durante todas estas horas estive calma e nem um "ai" se ouviu da minha boca só que começaram as complicações e tanto os meus sinais vitais como os da Madalena começaram a baixar. Até hoje o meu marido não consegue lembrar-se disso sem chorar.
A um determinado momento comecei a desfalecer e a deixar de sentir as dores. Lembro-me de fechar os olhos e pedir a Deus que salvasse a minha filha. Honestamente? Pensei que ia morrer ali mesmo e que não iria conhecer a Madalena. Tive medo, muito medo! Senti a vida a ir embora do meu corpo enquanto o meu marido me abanava em pânico, tentando arrancar de mim alguma reacção. Nesse momento uma nova equipa médica entrava ao serviço e não perderam mais tempo, fui levada às pressas para a cesariana e só quando me abriram é que viram que eu tinha uma condição muito delicada chamada placenta prévia. A Madalena por sua vez tinha engolido líquido amniótico, e como se isso não bastasse tinha 2 circulares do cordão umbilical à volta do pescoço e teve de ser reanimada.  
Pensámos que as batalhas da Madalena tinham ficado por aí mas com o passar dos meses era visível que algo não estava bem ainda que eu insistisse em não querer admitir que a minha filha poderia ter algum problema.
Quando se vive, como eu, com sentimentos de rejeição durante tantos anos ao ver-me confrontada com a possibilidade de uma filha que não fosse "normal" era mais do que eu conseguiria aguentar. Era como que uma facada no meu peito… "Nem para gerar filhos eu sirvo", "Claro! Tinha de ser comigo… Nada dá certo comigo!" Esses eram alguns dos pensamentos que me assombravam e que tanto me assustavam. Só quem como eu se sentiu indesejado ou inadequado sabe o que isto é. 
Começámos por tratar um problema que julgávamos ser a causa do desequilíbrio porém, ninguém nos preparou para o que viria a seguir.  Depois de uma série de exames rigorosos prescritos pela pediatra, então é que se abriu o chão debaixo de nós… A Madalena tinha lesões cerebrais nos 2 hemisférios do cérebro provocadas pelo parto o que a curto prazo a tornariam semelhante a uma criança portadora de paralisia cerebral. O diagnóstico era de que não iria ter autonomia, não iria correr, brincar e até conseguir comer sozinha seria uma vitória.
"NÃO, NÃO, NÃO!" gritei em frente à médica. Dei murros na secretária enquanto gritava que ela estava errada. Não, eu não ia ter uma filha assim! Fiquei furiosa, revoltada… Senti-me esquecida por Deus, castigada por alguma coisa que tivesse feito! O que eu mais temia, acontecia. Sentia que nem para ter filhos eu servia. Na minha cabeça eu era tudo o que de pior uma mulher podia ser! E foi exactamente isso que eu gritei a Deus. A dor era insuportável. Já não bastava o trauma do parto e agora isto!
É muito difícil admitir mas, naquele momento, eu desejei nunca ter ficado grávida. Apetecia-me bater em toda a gente que me dizia que tudo iria ficar bem, que confiasse em Deus, só que era eu que iria ter uma filha dependente de mim toda a vida, era eu que teria de lidar com todas as suas limitações. Queria ser forte mas a verdade é que, por momentos, a minha esperança e fé desapareceram. Eu queria orar pela minha filha mas tudo o que conseguia era chorar, gritar, gemer e nem o meu marido sabia como eram os meus dias. Passei dias inteiros a chorar de manhã à noite lutando contra as vozes que dentro da minha cabeça me diziam que a culpa da minha filha ter aqueles problemas era minha.
Se na altura eu dei a batalha por vencida? Dei! Se eu desisti de lutar? De certa maneira, sim! Aquelas notícias tinham destruído o meu sonho da família perfeita e isso… era mais do que eu conseguia aguentar.
Deus, porém, tinha outros planos para nós.
Inexplicavelmente, passadas algumas semanas apenas, a menina  já se sentava sozinha e começou a dar os primeiros passos sem qualquer ajuda.  
Seis meses depois da consulta, a Madalena entrava sozinha no consultório e a própria pediatra disse que estávamos perante um milagre pois os danos no cérebro eram extensos e profundos. Pouco depois, ao consultar um otorrino particular descobrimos que as lesões tinham-se estendido à audição.
A Madalena tinha uma surdez profunda bilateral. Teria mesmo de aceitar que tínhamos uma filha com deficiência. Não foi fácil! Às vezes penso que inconscientemente queria que ela fosse tudo o que eu nunca fui, tivesse o que eu não tive, alcançasse o que não alcancei. Acho que é normal desejar isso para um filho, certo? Querer que ele vá sempre mais longe, mas a medicina dizia-me que isso não seria possível, pelo menos não da forma que eu pensava, da forma "normal" pois ela era surda! 
Foi um longo processo até o meu coração ficar totalmente curado dessa ferida. Graças a Deus a Madalena foi operada e colocou um Implante Coclear. Hoje faz a sua vida normal.

Depois de tudo isto eu fiquei com pânico de engravidar novamente ainda que o meu sonho fosse ser mãe de uma menina e de um menino. Sem que eu me desse conta esse medo foi desaparecendo e o nome Davi Emanuel pairava sobre a minha mente. Afastei esse pensamento pois os médicos disseram que muito dificilmente voltaria a engravidar. Era difícil mas não impossível. Estabeleci uma data e passado um tempo, eu nem queria acreditar! A seguir ao meu marido, liguei ao meu pai que pediu um neto para poder ter companhia para ir ver o Benfica. Infelizmente não o conheceu pois faleceu no mês seguinte. Quando o meu pai faleceu tive de fazer uma escolha, ou  lutava com todas as minhas forças para manter aquele bebé dentro de mim ou deixava a dor tomar conta do meu coração.
Reprimi tudo e concentrei-me naquele bebé. O meu segundo milagre!
Lembro-me perfeitamente de pedir a Deus unicamente uma coisa, era que não tivesse qualquer deficiência. Eu não iria aguentar novamente. A gravidez decorreu sem qualquer problema mas fui seguida de outra forma. Vim para casa pouco antes do Natal com a recomendação de repouso quase absoluto. Na quinta feira dia 14 de Janeiro o Davi não mexia e recorri ao Hospital. Estava a perder liquido amniótico. Como a causa era desconhecida, fiquei internada e fui transferida para uma unidade hospitalar em Lisboa. Na manhã de dia 17, Domingo, estava entrar em pré-eclâmpsia outra vez. Disseram-me que perdi a consciência várias vezes. Lembro-me de ligar ao meu marido a avisar que o Davi ia nascer mais cedo… Lembro-me de ver no monitor da máquina a tensão a 25/17,5 e de ouvir alguém dizer que eu estava na eminência de ter um enfarte. Lembro-me de agarrar o médico cirurgião pelos colarinhos (literalmente) e a chorar implorar por uma epidural ao invés de anestesia geral pois tinha medo de morrer na maca e não vir a conhecer o meu filho. Mas Deus é fiel! O meu Davi iniciou a sua caminhada a vencer gigantes. Não teve sequelas do parto, ainda que os médicos dissessem que as mesmas só seriam visíveis entre os 6 e 12 meses, mas elas nunca apareceram pois Deus é bom!
Hoje a Madalena tem 13 anos e o Davi 7… Nunca imaginei que passaria por estas aventuras e que seriam estas as lutas que me ensinariam a ser mãe. Honestamente, hoje consigo avaliar que sem estes percalços o meu egoísmo não teria sido tratado. Se muitas vezes tive vontade de abandonar tudo e fugir? Sim, muitas mesmo!!! Mas… como alguém me disse num dia particularmente difícil "Ser mãe de uma criança especial, faz de mim uma mãe especial e por isso mesmo Deus achou que eu seria capaz!
Graças a Deus a Madalena tem hoje acesso a um Agrupamento de escolas com ensino bilingue para alunos surdos que, apesar de ser um pouco longe, tem feito maravilhas por ela! O apoio que temos recebido dos professores é fantástico e somos muito gratos por isso.
A família, os amigos, a igreja também têm sido um factor importante… É claro que nem todas as pessoas com quem lidamos conseguem ter a sensibilidade e a capacidade de se colocarem no nosso lugar mas acho que isso é normal.
Sou muito abençoada pela vida dos meus filhos e as alegrias que me dão não têm preço.
Ainda há dias em que tudo parece enevoado mas cada um deles, à sua maneira, dá-me a possibilidade de ver vitórias dentro da intimidade do meu lar e da minha família.
Apesar dos dias menos bons gostaria de encorajar todos aqueles que se deparam com este tipo de situações, seja negligência médica, gravidez ou parto que não corre conforme o esperado a ter fé e esperança em dias melhores. O choro pode durar uma noite ou até muitas mas a cada manhã é-nos dada a possibilidade de lutar por aquilo que desejamos que aconteça! A cada novo dia surge uma nova hipótese de milagre e tudo, TUDO é possível ao que crê!
Quase 15 anos depois do nosso casamento e após muitas lutas continuamos juntos… Não porque somos bons mas porque Deus é bom e fiel ao que promete! Se arriscava uma terceira gravidez depois disto tudo? Sim, completamente! 


por Tânia Palmeiro
Edição @Ana Valido


fotos cedidas por @Tania Palmeiro

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

O bebé também é da Avó!

Qualquer semelhança... NÃO É pura coincidência! São manos mesmo! O babete é o mesmo! São a alegria desta mamã!
16 anos separam estas 2 fotos mas o amor, esse... cresce até sufocar de tanta alegria!
Apesar das semelhanças entre os meus amores, hoje vou falar de diferenças.
Enquanto a mamã vai trabalhar, o Simão fica com a avó, minha mãe, em casa. Não tenho palavras para agradecer à minha mãe pelo seu acto de pura generosidade em vir para ficar com o netinho mais novo. 
O tempo de regressar ao trabalho aproximava-se, galopante, e o meu coração ficava pequenino, pequenino só de imaginar o meu Simãozinho na escolinha, com 6 mesinhos, a sair de casa com frio, chuva... enfim! Com tudo o que a irmã passou aos 5 meses (fez em Dezembro 16 anos).
A minha mãe ainda trabalhava na altura e a Beatriz teve de ir para a escolinha. 
Todas as mães que já passaram por esta primeira separação sabem do que falo. As lágrimas, a saudade, o aperto no peito, o pé no acelerador no final de um dia de trabalho a tentar encurtar o mais rápido possível a distância que nos separa do quentinho daquele abracinho, do olhar que nos ama incondicionalmente, do sorriso que nos derrete de tanto amor!
A sensação desta vez foi bem diferente. Uma paz enorme, uma tranquilidade segura, tão segura como as mãos competentes e amorosas que cuidam do meu Simãozinho quando estou ausente.
Ninguém como eu sabe melhor o valor da enorme riqueza que é ser criada pela sua avó. Sabem tanto como eu, mas mais... é difícil. Foi um privilégio ter ao meu lado, até aos meus 14 anos, altura em que partiu, a avó mais amorosa e espectacular do mundo! A minha! Escrevo-o com lágrimas de saudade e profundo amor que os anos, tantos já, não apagam. É por esse motivo que estou muito grata à minha mãe por cuidar do Simão. Vai fazê-lo pelo tempo que ela puder. Quando não puder, ele irá passar por uma outra experiência que a mana já passou, bem diferente claro. A de ser acarinhado e cuidado por pessoas fantásticas, humanas e muito competentes, que já conheço bem, que não são da família mas que irão fazer parte da sua vida, da nossa. 
Sempre disse e reafirmo, não há dinheiro no mundo que pague os nossos filhos serem bem cuidados e acarinhados. Dinheiro da escola foi coisa que nunca chorei!
Mas, aqui entre nós que ninguém nos ouve... espero que esse tempo demore muuuuito a chegar. Até lá o Simão vai aproveitar os miminhos da vovó, vai crescer cheio de mimo e a chata da mamã vai poder continuar a telefonar as vezes que quiser para saber do seu bebé, e os outros 2 netos, e as filhas é que aproveitam e bem, não pensem que é só o Simão... a avó distribui mimos por onde passa!
Vivam as avós!
Obrigada por me lerem.